TEXTO ATUALIZADO EM 01/11/2019, ÀS 11H04
Presidente da Convenção Batista do Estado de São Paulo (CBESP) e ministro na Primeira Igreja Batista de Ribeirão Preto, no interior do Estado, o pastor Genilson Vaz concedeu sua primeira entrevista institucional após ser eleito em julho passado na 111ª Assembleia CBESP. À reportagem da Revista Batistas SP (BSP), ele respondeu a 11 questões, as quais abarcaram temas diversos dentro do interesse convencional. Alguns deles, inclusive, bastante sensíveis e pouco explorados.
“Temos, nas igrejas pelo Estado, pessoas valorosas para liderar, com capacidade, ideias, mas, pelo descrédito da instituição, se afastaram”, argumentou ao falar do engajamento em prol do resgate da unidade do povo batista, um dos assuntos valorizados na conversa publicada na edição 16, cuja a capa tratou da luta contra o suicídio – tema observado a propósito também da Campanha Setembro Amarelo. O texto é reproduzido hoje (30) como menção ao Dia da Reforma Protestante, data lembrada nesta quinta-feira, 31.
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Mais humana, menos pesada*
Por Chico Junior
Eleito em julho presidente da Convenção Batista do Estado de São Paulo (CBESP), pastor Genilson Vaz acumula experiências na denominação. Já liderou a Convenção Batista do Distrito Federal e Ordem dos Pastores Batistas do Distrito Federal, como também a Junta de Missões Mundiais, onde serviu como vice-presidente.
Natural de Mantena (MG), pastor há quase 30 anos, tendo começado o ministério em Brasília, também é graduado em Direito, tendo servido como docente nas disciplinas de direito empresarial, trabalhista e tributário.
Esse repertório é lastro diante de desafios e perspectivas no servir à CBESP. Sem reservas, ele tratou de assuntos delicados, como o distanciamento de igrejas e pastores da Convenção, a falta de juventude nas lideranças e a carência de produção acadêmica denominacional. Entre os sonhos, disse ter o desejo de ver uma instituição “mais humana e menos pesada”. Leia trechos da conversa:
Diante da agenda pastoral tão exigente de uma igreja às portas do centenário, por que ser presidente da Convenção Batista do Estado de São Paulo?
Tenho 58 anos, nascido em lar cristão, batista, meus pais já estavam nisso quando nasci, então, fui criado nesse ambiente desde a mais tenra idade. Na adolescência, eu percebia que Deus me dava ferramentas de liderança. Ao mesmo tempo, porque meu pai sempre amou a denominação e nos ensinou a amar também, sempre parti do princípio que cabe a nós, líderes em áreas menores, igrejas e organizações, se a porta é aberta, liderar áreas maiores. Isso, por princípio de responsabilidade. Primeiro, alguém tem que liderar. Segundo, Deus dá a capacidade de liderar. E entendo que isso nos leva ajudar a denominação.
O senhor mencionou amor à denominação, porém, é perceptível a diminuição de mensageiros nas Assembleias e nos grupos, como jovens e homens, o afastamento de igrejas e pastores, e o enfraquecimento institucional. Como reverter isso e reaproximar a CBESP desses grupos?
Na minha ótica, temos vivido uma pós-institucionalização. Houve um ápice em que se viveu pela e para a instituição. Esse ápice entrou em declínio, estamos na metade dessa queda. As pessoas têm-se voltado mais para a instituição menor, elas mesmas, lar, família e igreja. Ou seja, a gente percebe nitidamente a ausência de fatias que estão presentes na igreja e ausentes na instituição, nesse caso, denominação, que se concretiza na Convenção. É aí que deve haver um repensar: o que a instituição está oferecendo a esse pessoal? Nós tivemos recentemente uma discussão com relação a um congresso batista, em um dos grupos de que participo, no qual houve a seguinte reflexão: o que a juventude, no caso, quer ouvir e o que precisa ouvir. Daí, surgiu a questão: entre o querer e a necessidade, o que a instituição tem oferecido a ela? As Convenções, em termos de Assembleia, não oferecem nenhum atrativo aos jovens – falo isso porque sou pai de dois jovens. Imagino que a gente precise pesquisar, entender, e inserir nos programas das Assembleias motivações para essa turma chegar, do contrário, nós vamos ter, daqui para frente e em breve, um problema sério de liderança na denominação.
Entre as diretorias recentes, esta é a primeira que conta com uma jovem abaixo 35 anos. A presença de uma líder da juventude amplia a oportunidade para novos quadros?
Amplia. Com o ingresso de mais jovens, a gente tem algumas situações que vão acontecer. Primeira situação: a liderança mais madura tem a preocupação de manter a estrutura funcionando. A entrada de jovens vai demonstrar capacidade dessa turma, de gerenciamento, de gestão. E vai demonstrar que ninguém é insubstituível. O processo de renovação tem que ser natural, e ele, inclusive, deveria começar na igreja local e, aí sim, se refletir na instituição. Porque esse quadro que temos nas Convenções é um espelho da igreja local. Sem generalizar, a gente percebe que não há renovação de liderança na igreja local.
Estudiosos apontam que as instituições tendem a ser lentas. Como fazer a gestão se acelerar, para geração de liderança, frente à ameaça de vácuo de líderes?
A nossa denominação, que tem diversos pontos positivos, tem outros negativos. Nossa estrutura é morosa. E por ser batista me sinto à vontade em fazer essa crítica: essa morosidade só nos atrapalha. Tínhamos de ser mais céleres. Algumas situações práticas demandam decisão que, às vezes, passam por pessoas que não estão no dia a dia. E é difícil, porque esse tipo de governo está em nosso DNA, e você teria de mudar o DNA.
“O processo de renovação tem que ser natural,
ele, inclusive, deveria começar na igreja local”
Em sua primeira fala, logo após eleito, citou o trabalho em prol da unidade, do engajamento, e da presença das igrejas como um todo, já que houve menos de 10% de representação do Estado. Qual a perspectiva de ação para aumentar a unidade e o engajamento?
É importante historiar que esse quadro é geral, não só da CBESP. Isso se aplica de novo ao distanciamento de que falamos. Uma igreja, qualquer que seja, irá sempre no comando que o líder lhe der. Se ele não tiver interesse na aproximação, obviamente o grupo também não terá. Eu digo na minha igreja: não adianta questionar aquilo de que você não participa. Minha resposta a essa questão é que o líder precisa ser convencido e, para tanto, precisa ser chamado: “Vem cá, amigo, por que está distante? Sabe como funciona a estrutura?” – e mostrar a ele a estrutura.
Outra coisa é a descredibilização da instituição. Muitas vezes ela é denegrida por situações pelas quais passa ou cria. A descredibilização afasta as pessoas em todos os sentidos, física e financeiramente, em termos de liderança. Temos, nas igrejas pelo Estado, pessoas valorosas para liderar, com capacidade, ideias, mas, pelo descrédito da instituição, se afastaram. Nós estamos esfacelados como grupo batista. Se conseguirmos mostrar que há sempre uma nova possibilidade, sobretudo, na questão da unidade, acho que a gente consegue salvar muita coisa, e, daí, com credibilidade, a partir da liderança da instituição, buscar esses que, de alguma forma, possam contribuir com a denominação. Temos gente e valores excelentes.
Essa é uma medida que pretende trabalhar?
Gostaria de trabalhar isso a partir da Diretoria, ouvir aqueles que devem ter ideias muito melhores que as minhas, e ver o modo que podemos colocar isso em prática, para não ficarmos numa liderança, mantendo o mesmo padrão: decisões numa sala, comando pra fazer, mas você não vê, a partir da porta pra fora, isso acontecer. Algo que repercuta lá nos liderados. Não adianta repercutir só aqui. A gente que tá aqui sabe como funciona a estrutura e quais são as nossas falhas. Temos as nossas críticas. Mas essa nossa voz tem que sair aqui do ambiente e chegar no principal objetivo, que é na igreja local. E não só buscar levar à igreja que “mais relevante”. Na igreja, lá do recanto, temos que chegar e dizer que ela é parte disso. Se a gente conseguir que isso se estabeleça, eu, pessoalmente, me darei por satisfeito.
O distanciamento das igrejas é prejudicial às finanças, certamente, mas também o é a respeito do capital humano. E, pela sua sinalização, a Presidência e a Diretoria pretendem executar algum plano para estar com as igrejas pequenas, médias e grandes?
Sei que é difícil, num quadro tão pequeno, mas a gente tem que propor uma fórmula pra isso. Por exemplo, a representação, que significa presença, tem que ser eficiente e necessária. Se a gente achar uma metodologia ideal pra atender presencialmente as igrejas, já conseguiríamos atrair a atenção delas à denominação.
“A estrutura precisa ser regada pelo coração”
Esforço concentrado para isso?
Na minha cabeça, sim. Não podemos fazer como uma promessa que vai acontecer. Mas é uma tentativa de achar uma fórmula. Isso faz uma diferença para o pastor que está lá no cantinho dele e que fala assim: “A minha igreja não é valorizada”.
A produção acadêmica de nossas casas teológicas ainda é doméstica. Contudo, a sociedade tem trazido demandas à porta dos evangélicos e, os batistas, talvez poderiam contribuir e também se posicionar. De que modo a Presidência pode provocar um ganho nos ambientes teológicos?
Historicamente, nossa denominação nunca deu grande ênfase à teologia propriamente dita. Não no fazer teológico, mas sim no praticar. Sou de uma geração que falava de vocação para o ministério pastoral. Por vocação, ele é um teólogo. Vai se aprofundar em teologia como ferramenta para o pastoreio. Ao mesmo tempo, temos alguns vocacionados pro magistério teológico. Talvez de uns 20 anos para cá, vem surgindo pensadores no ambiente batista. Acontece que nossa estrutura teológica não fomenta o fazer teologia. Enquanto denominação, temos que focar no pensar teológico. Ao focar, incentivar e dar condições. É um tripé. Nós temos uma instituição aqui que poderia, e eu diria até deveria, se posicionar como um centro de excelência do pensamento teológico. Mas a formação nossa é básica e às vezes você desperdiça excelentes pensadores tornando o pensador um pastor. É uma questão de cultura no Brasil.
Quais são seus sonhos?
Todo mundo tem sonho. Alguns você acalenta e não tem possibilidade de expressar. E quando assume uma liderança ou se casa, começa a ter sonhos. Agora, o sonho que acalento no coração para todas as Convenções é o de uma estrutura que seja menos pesada e mais humana. A gente investe muito no regulamento, e as pessoas vão ficando de lado. A gente é gente. É povo. E esse peso da estrutura às vezes desumaniza. Há pastores entristecidos, adoecidos, porque só chega a ele a estrutura. Não chega o relacionamento. “Irmão, como está? Não vim lhe falar da denominação, quero saber como você está?”. Então, é, assim, um sonho que ficaria feliz se ele acontecesse. A estrutura tem de girar, mas tem que ser regada por coração, choro, oração.
* Reproduzido a partir da Revista Batistas SP (Ano III / Edição 16).